domingo, 7 de outubro de 2012

ANO DA FÉ...


Ao longo do “Ano da Fé” proclamado pelo Papa Bento XVI, proponho-me escrever uma série de artigos sobre “o dom da fé”. Desejaria ilustrar como a fé é um dom concedido por Deus aos homens e como estes, uma vez que dele beneficiam, o oferecem também aos seus semelhantes com o testemunho pessoal e comunitário e o anúncio do Evangelho. O programa dos artigos não está delineado. Cada um irá saindo conforme a inspiração do momento e a sugestão dos acontecimentos. Espero poder ser útil aos leitores para alimentar a sua fé e, quem sabe, poder ajudar alguém a receber o mesmo dom ou a redescobri-lo na sua vida. Assim o Espírito Santo me inspire.

A fé, refere o apóstolo São Pedro, é dom “mais precioso que o ouro” (1 Pe 1,7), concedido a quem conhece Jesus Cristo, se deixa cativar pela sua pessoa, pelo seu amor e pelo seu Evangelho e a ele se entrega numa relação pessoal de confiança e de amor. Na tradição cristã, a experiência da fé é explicada, a partir dos milagres evangélicos da cura da cegueira (cf Mc 8, 22-25; 10, 46-52), como uma iluminação. Num deles, depois da primeira intervenção de Jesus, o cego começa a ver mas com pouca nitidez: via os homens “como árvores a andar”. Jesus interveio novamente sobre ele e então o homem “viu perfeitamente”, “distinguia tudo com nitidez” (Mc 8,24-25). A fé é assim como uma luz interior e exterior que faz ver, que ilumina o olhar e o entendimento e faz adquirir uma visão nova, divina, sobre a própria vida e sobre a realidade. A fé é também dom de conhecimento sobre Deus e suas propostas de vida para os homens.
O dom da fé é igualmente relação, presença, companhia amorosa de Deus na vida dos crentes e motivação para o seu agir quotidiano. Daí que a Igreja faça esta oração: “Senhor, que a vossa graça inspire as nossas obras e as sustente até ao fim, para que toda a nossa atividade por vós comece e em vós acabe” (LH IV, 659). O mesmo dom cria laços não somente com Deus mas também com os demais crentes gerando comunhão e fraternidade, congregando os fiéis numa família. É a experiência da vida em Igreja nas suas múltiplas dimensões.
Deus concede o dom da fé através da revelação e do encontro com seu Filho Jesus Cristo. Este, por sua vez, dá-nos a conhecer o rosto de Deus como Pai, amor, relação, comunhão, graça. São João testemunha “que o Filho de Deus veio e nos deu entendimento para conhecermos o Verdadeiro; e nós estamos no Verdadeiro, no seu Filho, Jesus Cristo. Este é o Verdadeiro, é Deus e é vida eterna” (1 Jo 5, 20). É portanto por Jesus que conhecemos a Deus. E é de Deus que recebemos a fé, como ensina Jesus: “Ninguém pode vir a mim, se o Pai que me enviou o não atrair, (…) se isso não lhe for concedido pelo Pai” (Jo 6, 44.65). E são Paulo aplica à confissão de fé em Jesus: “Ninguém pode dizer: «Jesus é Senhor», senão pelo Espírito Santo” (1 Cor 12,3).
Se a fé é um dom acessível a todos, como pode o homem ter acesso a ele e recebê-lo? O papel da Igreja e dos crentes é fundamental. Foi assim desde o princípio da história cristã. O testemunho dos cristãos e o anúncio do Evangelho abriram caminho a muitos para conhecerem Jesus Cristo e lhe abrirem o seu coração, recebendo pelo Espírito Santo o dom da fé. O Livro dos Atos dos Apóstolos e os escritos apostólicos do Novo Testamento documentam bem toda a essa aventura. Quem acolhia a palavra dos apóstolos perguntava: “Que havemos de fazer?”. A resposta era: “Convertei-vos e peça cada um o baptismo em nome de Jesus Cristo. Recebereis, então o dom do Espírito Santo”. E após a referência à vida nova dos cristãos, o relato conclui: “O Senhor aumentava, todos os dias, o número dos que tinham entrado no caminho da salvação” (cf Act 2, 37-47).
A fé pode e deve ser desejada, procurada e suplicada pelo homem. É significativa a confissão de um escritor do nosso tempo. No final da sua obra escreve: “O meu segredo é que preciso de Deus – estou doente e já não me safo sozinho. Preciso que Deus me ajude, porque pareço já não ser capaz de dar; que me ajude a ser bom, porque pareço já não ser capaz de bondade; que me ajude a amar, porque pareço já não ser capaz de amar” (D. Coupland). E a expressão de uma busca quase desesperada. Quem procura, mais cedo ou mais tarde encontra. O encontro com Deus pode acontecer numa experiência inesperada, intensa e mística ou de uma forma mais suave e progressiva. Aquela é mais rara, mas acontece. Nesta, a pessoa faz um caminho que a aproxima da luz até que se sente iluminada por ela. Num ou noutro caso, a receção do dom da fé marca a pessoa e determina o seu modo de pensar, viver e agir. O dom da fé também se pode perder devido ao desleixo, desinteresse, escândalo, abandono. Ou ainda por a pessoa se ter deixado fascinar ou dominar por outra experiência ou realidade do mundo. Falaremos certamente destas coisas em artigos futuros.

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